terça-feira, 12 de novembro de 2013

Bolsa Creche em São Paulo

Olá pessoal,

Enquanto membro da comissão gestora do Fórum Municipal de educação infantil, me posiciono veementemente contra a PL 139/2013 do Vereador Jair Tatto que institui a bolsa creche. Nós do FEMEISP, consideramos que respostas  de cunho emergenciais, com ausência de planejamento e sem considerar a criança como foco principal como o bolsa –creche, provocará a abertura de inúmeras creches sem condições efetivas para funcionamento, com falta de materiais, equipamentos, profissionais qualificados promovendo um atendimento provisório e precário,ou ainda, estimulará o atendimento das criancas de forma doméstica, nos moldes das mães crecheiras. Em ambos os casos, as crianças são desrespeitadas em seus direitos básicos.Desde a Constituição de 1988, é direito da criança o atendimento público, gratuito e em instituições de boa qualidade.
Confiram abaixo o documento organizado pelo GT de Educação da Rede Nossa São Paulo, assinado também por nós do FEMEISP:

A prof. Ana Mello e o Prof. José Marcelino, ambos da USP estudaram o impacto desse tipo de auxílio no atendimento ãs crianças e escreveram o texto abaixo. Vale a pena a leitura e a divulgação! 


Bolsa Creche também na cidade de São Paulo?

Ana Maria Mello e José Marcelino Rezende Pinto


Desde 1986, no Brasil, o Ministério do Trabalho e Emprego autorizou empresas a substituir à exigência de manterem creches no local de trabalho (389, CLT) pelo auxílio ou bolsa creche. Portanto, esse tipo de "benefício" adotado em empresas públicas e privadas não é novo. 

Começa agora a surgir em alguns municípios como Piracicaba, Hortolândia e possivelmente em São Paulo o repasse de dinheiro público. O Projeto de Lei (PL) 139/2013, na cidade de São Paulo, denominado programa Bolsa Creche, de autoria do vereador Jair Tatto (PT), foi aprovado (5/11/2013) por votação simbólica, com três votos contra, Mário Covas Neto (PSDB), Orlando Silva 
(PCdoB) e Toninho Vespoli (PSOL).

Pretende-se repassar aos pais meio salário mínimo (R$ 339,00) por criança abaixo de três anos sem vaga em creches. O projeto ainda precisa passar por uma segunda votação em plenário antes de seguir para a sanção do Executivo, mas sabemos que o PL é simpático aos olhos de muitos vereadores, pais e educadores brasileiros. 
O modelo do repasse é flexível e por isso também militantes e especialistas temem que a família simplesmente destine a verba para complementar seu orçamento doméstico. Diz a reportagem da Câmara que a criação da "Bolsa Creche é uma "medida emergencial", de acordo com a justificativa do projeto, que estima o déficit na rede de educação infantil municipal em 94 mil vagas. A estimativa é que o projeto beneficie 50 mil crianças em três anos.”
Há outras manobras sendo feitas para ampliar vagas, por exemplo, transformar vagas de tempo integral em parcial responsabilizando as famílias, diz os gestores que há pedidos de atendimento parcial em regiões paulistanas. Como se as capitais brasileiras tivessem alternativas para a educação e o cuidado infantil, mobilidade de transporte público etc.
No Brasil e no mundo há predominância de dois modelos de auxílio-creche. No chamado Modelo Flexível os beneficiários têm direito a uma verba que eles próprios destinam para o que preferirem como tem sido feito na Universidade de São Paulo. À primeira vista, parece ser correto o próprio cidadão poder "escolher" a educação e o cuidado que deseja para seu filho pequeno. Entretanto esse modelo, usado predominantemente nos EUA, Grã-Bretanha, Nova Zelândia, Austrália e Canadá, desresponsabiliza a empresa e o Estado em acompanhar o oferecimento e a controlar a qualidade de atendimento das crianças assim providas. Esse Modelo pode ser incluído nos chamados mecanismos de seletividade social, que nada mais oferecem que uma proteção social mínima, em níveis básicos de renda, que desresponsabilizam o empregador e agora no modelo brasileiro o Estado através de suas prefeituras.
Já no Modelo Vinculado, a empresa (ou o órgão publico), controla a destinação do auxílio através de seus Acordos e Convenções Coletivas de Trabalho, como ocorre no Hospital das Clinicas de Ribeirão Preto, na UNICAMP e no Ministério Publico do Estado de São Paulo. São modelos que organizam travas e normatizam as destinações do beneficio, garantindo que a verba seja 
usada apenas para a infância, daí alguns autores denominarem esse modelo de auxílio criança, infância ou auxílio educação. Muitos países utilizam o Modelo Vinculado sendo o beneficio administrado pelo o empregador e/ou comissões com representações sindicais. A França, por exemplo, atribui ao Modelo Vinculado à responsabilidade por 75% das mulheres com filhos pequenos que permanecem no mercado de trabalho. Há outros exemplos no continente europeu em que esse formato de "proteção" à infância é escolhido. Alguns autores considera ser essa mais uma das tendências para uma nova ordem mundial, desenhando as perfectivas futuras dos países que conseguiram organizar o Estado do Bem - estar Social. No Brasil, na declaração anual de imposto de renda, o contribuinte (empresário) pode escolher a opção de destinação denominada lucro real, sobre a qual é descontado o imposto devido pelo empresário, impossibilitando a análise das vantagens tributárias para o empresário em adotar este modelo de benefício. 
O que é importante saber é que o auxilio creche é um dispositivo legal no Brasil para empresas publicas e privadas que surge na contramão da expansão das unidades de educação infantil, é assistência indireta as famílias que tem filhos menores de 3 anos que diretamente não serão os beneficiados. Lembrando que na gestão passada (Gilberto Kassab) um PL semelhante foi considerado inconstitucional.
O que sabemos desde já é que a situação da cidade de São Paulo sinaliza para a progressiva (des)responsabilização, por parte do poder público, de oferta direta de creches e pré-escolas. Não fica claro, por exemplo, onde esses gestores irão buscar esse financiamento, muito menos qual secretaria irá se responsabilizar pelos detalhes da gestão desses "benefícios". Mas pode-se supor que essa situação está em consonância com as diretrizes de reforma do Estado tanto para o enfrentamento da crise fiscal, na mudança do foco de sua intervenção econômica e social e na mudança da estrutura administrativa. 

Assim vale prestarmos atenção e analisarmos continuadamente os propósitos de desvio de verbas destinado à infância pequena, e tentar impedir a segunda votação do PL 139/2013, como também, sensibilizar a população para um novo retrocesso dos direitos das crianças sob aparência de vantagens. 

Ana Maria A. Mello (Doutora em psicóloga - educação pela FFCL USP em Ribeirão Preto 
José Marcelino Rezende (Professor titular no Departamento de Educação,Informação e Comunicação - FFCL USPRP). Entre 2007 - 2011 eles estudaram o IMPACTO DO AUXÍLIO CRECHE NA EDUCAÇÃO E NO CUIDADO DAS CRIANÇAS ABAIXO DE 6 ANOS.

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