sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Creches do país atendem apenas 22,53% das crianças de zero a três anos

Oi Pessoal,
Segue abaixo uma matéria sobre o caráter educativo e o financiamento das creches no Brasil. Traz uma entrevista comigo, com Salomão Ximenez da Ação Educativa e o Prof. Luiz Araújo, da Universidade de Brasília.
Importante reflexão trazida pela Fundação Abrinq.
Abraço!

Link para a reportagem: http://www.fundabrinq.org.br/index.php/em-pauta/15:creches-do-pais-atendem-apenas-22-53-das-criancas-de-zero-a-tres-anos




Para aumentar o atendimento e garantir qualidade, especialistas defendem o aumento do financiamento para a educação infantil

A falta de vagas em creches é um dos grandes desafios a serem superados na área de educação no Brasil. Segundo dados do relatório Desafios na Infância e na Adolescência no Brasil: Análise Situacional nos 26 Estados Brasileiros e Distrito Federal, produzido pela Fundação Abrinq, apenas 22,53% das crianças de zero a três anos do país estavam matriculadas em creches em 2012. 

Regionalmente a situação é ainda pior. Os estados da região Norte e Nordeste são os que apresentam os índices mais baixos nesse indicador, sendo o Amapá, Amazonas e Pará os que possuem as piores taxas de cobertura em creches em todo o país, com 5,15%, 6,58% e 6,74%, respectivamente. Santa Catarina, por sua vez, possui a melhor posição nesse indicador, com 39,23% das crianças de zero a três anos matriculadas nessa etapa de ensino.

Sancionada em junho de 2014, a Lei nº 13.005/20914 aprovou o Plano Nacional de Educação (PNE) que tem em sua primeira meta o objetivo de ampliar a oferta de educação infantil em creches para atender, no mínimo, 50% das crianças zero a três anos até 2024.

A Constituição Federal determina que é dever do Estado garantir a educação infantil em creche e pré-escola às crianças de até cinco anos de idade. Entretanto, durante muitos anos, as creches foram vistas somente como espaços assistencialistas, voltados mais para atender às necessidades adultas, pois as creches eram vistas como locais onde os pais poderiam deixar os filhos durante a jornada de trabalho. Porém, atualmente vem crescendo o entendimento de que as creches são espaços educativos e que devem estimular o desenvolvimento das crianças.

Segundo Janaína Maudonnet, membro da comissão gestora do Fórum Municipal de Educação Infantil de São Paulo e mestre em Educação, desde o nascimento, a criança aprende o significado das linguagens e práticas sociais nas quais está inserida por meio da interação com outros adultos e crianças. Portanto, a educação infantil, juntamente com a convivência com a família, tem um papel importante nesse processo de construção do conhecimento e da socialização.

Para ela, quando as creches são entendidas como ambientes educativos, as práticas culturais que fazem parte do currículo das crianças passam a ser planejadas, observadas e avaliadas. “O modo como as crianças são postas para dormir, como são banhadas, alimentadas, as brincadeiras que são ensinadas, as histórias lidas, as musicas cantadas, a maneira como os aniversários são comemorados, as palavras escritas que circulam e as descobertas científicas apresentadas e a maneira como todas essas práticas são vivenciadas contribuem para a formação da personalidade da criança, para a construção de sua autonomia, autoconfiança e visão de mundo. E é por isso que precisam ser intencionais e planejadas”, explica Maudonnet. 


Financiamento da educação





No Brasil, a Constituição Federal determina que União, estados e municípios devem organizar seus sistemas de ensino em regime de colaboração. A legislação especifica que os estados e o Distrito Federal deverão atuar prioritariamente no ensino médio e fundamental. Os municípios, por sua vez, atuarão prioritariamente na educação infantil e também no ensino fundamental. Já a União deve garantir a oferta da educação superior e colaborar de forma técnica e financeira com os estados e municípios.

Os investimentos em educação no país são feitos com os recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), fundo especial existente em cada Estado e no Distrito Federal, composto por recursos originários de impostos e transferências vinculadas à educação, de responsabilidade dos estados e municípios. A União complementa em, no mínimo, 10% o valor total arrecadado no Fundo.

A distribuição dos recursos do Fundeb entre estados e municípios é feita de acordo com a proporção do que é arrecadado por estado e o número de alunos matriculados nas redes de educação pública em cada etapa e modalidade de ensino. Cada etapa e modalidade possuem fatores de ponderação diferentes, por isso, o cálculo do custo de cada aluno matriculado em creche, por exemplo, é diferente do valor de cada aluno do ensino fundamental. 

Entretanto, nos moldes atuais, esses valores de custo por aluno são insuficientes para atender e garantir a qualidade do ensino em todas suas etapas e modalidades. Por isso, ao longo dos últimos anos, diversas pesquisas e estudos sobre os fatores que influenciam na qualidade da educação básica no Brasil foram realizados e chegou-se ao chamado Custo Aluno Qualidade (CAQ). Aprovado no PNE, o CAQ determina um valor mínimo a ser investido por aluno para garantir padrões de qualidade de ensino em todo país. Esse valor deverá ser obrigatoriamente complementado pela União, caso os entes federativos não consigam cumprir com a meta de investimento mínimo.

Além disso, desde 2013, tramita na Câmara dos Deputados o PL nº 7.029/2013, de autoria do deputado Alessandro Molon (PT/RJ) e baseado em sugestão da Fundação Abrinq, que pretende aumentar a participação da União na complementação do Fundeb dos atuais 10%, no mínimo, para 50%. A proposta almeja, ainda, dobrar o valor do fator de ponderação máximo regulamentado na lei para as creches públicas em tempo integral.

De acordo com professor doutor em políticas públicas e educação da Universidade de Brasília (Unb), Luiz Araújo, em geral, o Fundeb representou um avanço para o financiamento da educação na Brasil. Entretanto, ele considera o modelo insuficiente para elevar da forma necessária a qualidade da educação no país. “Os fundos tornaram mais justas a distribuição da parcela de recursos entre estado e municípios, mas não conseguiram estabelecer um novo patamar de prestação dos serviços”, afirma o professor.

Para que isso aconteça, Luiz Araújo acredita que o aumento da participação da União no financiamento da educação é essencial. “A participação da União no financiamento da educação, considerando todas as etapas, é desproporcional a sua capacidade de tributação. Enquanto ela fica com 57% do que o brasileiro paga de tributo, aplica em torno de 20% na educação. Isto sobrecarrega estados e municípios”, explica. 

Na opinião de Salomão Ximenes, doutor em Direito e mestre em Educação, para que se atinja a meta proposta pelo PNE – de garantir que, até 2024, 50% das crianças de zero a três anos do Brasil estejam matriculadas em creches – além de aumentar a participação da União no financiamento da educação, é preciso que os repasses destinados a essa etapa de ensino aumentem. “O fator de ponderação para creche está totalmente fora dos padrões reais do seu custo. Dizer que um aluno de creche custa apenas 30% a mais do que um aluno do ensino fundamental é uma ilusão. É um desestímulo para que os municípios expandam a quantidade de vagas em creches”, diz Ximenes. 

Segundo ele, devido a essa defasagem entre o cálculo do custo estabelecido em lei e o custo real de cada aluno matriculado em creche, muitos municípios têm precarizado o atendimento para essa etapa de ensino apenas para alcançar a meta proposta pelo PNE sem se preocupar em garantir qualidade.

“Existem duas formas de precarizar: a terceirização da gestão e do atendimento das creches e pré-escolas e a redução da carga horária. Vários municípios, como Fortaleza, por exemplo, praticamente eliminaram o atendimento em tempo integral. Uma situação absurda, porque coloca as crianças em situações de vulnerabilidade”, conta Ximenes, que completa: “Como o fator de ponderação tem um cálculo absolutamente irreal, acaba sendo mais vantajoso para o município atender duas crianças em tempo parcial do que atender uma em período integral, pois o fator de ponderação não dobra”, lamenta.

Luiz Araújo também afirma que sem que os repasses sejam reais e atrativos, será difícil garantir o crescimento sustentável e evitar a criação de uma rede de atendimento precarizada e, até mesmo, terceirizada. Para ele, é possível cumprir a meta do PNE se houver aporte de recursos da União e ajuda dos estados para que os municípios consigam estruturar os serviços de atendimento. “E isso é urgente. O tempo passa rápido e excluir milhões de crianças é uma perda irreparável para o que queremos paro o Brasil nos próximos anos”, conclui.


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