Olá a todas e todos!
Reproduzo abaixo a conferência de Manuel
Sarmento no 28o. Simpósio Mundial da OMEP. Sarmento é professor da Universidade
do Minho, em Portugal e uma das principais referências na da Sociologia da Infância.
Primeira Infância no Século XXI: direito das crianças de viver, brincar, explorar e conhecer o mundo
O autor iniciou sua fala tratando da Convenção
dos Direitos das Crianças (Aprovada
na Assembléia Geral das Nações Unidas em 1989) que representa no plano jurídico
de uma nova concepção social da infância, uma outra idéia da criança que se
impõe a idéia voltada pelo principio da negatividade. Criança definida não pelo
que é, mas pelo que não poderia fazer: não votar, não casar, não trabalhar, não
beber. Com a convenção proclama-se a idéia de criança capaz, competente e
participativa. Idéia de criança como cidadã. Cidadania da infância que as
crianças são protagonistas, sujeitos ativos de direitos. Três PS: Proteção
contra violência, maus tratos, exploração; Provisão
- Estados se obrigam a garantir as crianças as condições fundamentais de vida e
dignidade, Provisao é exigência, garantia do Estado; Participação que aparece pela primeira vez em um documento oficial:
criança tem o direito de participar ativamente em tudo que lhe diz respeito (
ex: ouvir a criança em processos judiciais), Criança deve ser informada e ter
acesso ao conhecimento para participar ativamente.
Direitos das crianças constituem base de
trabalho fundamental para muitos países do mundo. Dois países não assinaram:
Somália e EUA. Trata-se de um dos documentos do mundo mais reconhecidos e com
maior impacto mundial. Faz sentido ter um ponto de vista critico sobre ele, mas
é um ponto de partida para ser aprofundado e ampliado.
Mas há contradição entre a lei escrita e a
lei na pratica. Na prática ela não é aplicada em muito locais. Diversidade
cultural precisa ser defendia, sem cair no relativismo que contrapõe aos
direitos das crianças.
Estado de direitos no mundo são contraditórios. Direitos que se colocam em uma sociedade contraditória .
Paradoxo: nunca se foi feito uma tão vasta proclamação dos direitos das
crianças e nunca houve uma restrição social tão grande às crianças, sobretudo
em países pobres, nunca como hoje houve tanto controle simbólico sobre as
crianças, nunca como hoje crianças ficaram tanto em Instituições e em instituições
que estão vivendo em uma crise.
Características da sociedade
contemporânea: Vivemos uma 2a. Modernidade marcada pela globalização (política,
econômica e cultural) e o individualismo institucionalizado. Beck Gemshem 2003.
A infância proclamada nos direitos da
convenção vive no interior de uma regulação social, que tem uma administração
simbólica da infância que é construída nessa sociedade de forma avançada do
capitalismo. Essa regulação se exprime em regras formais e não formais
(simbólicas, através de crenças, mas que fundam os laços sociais).
GLOBALIZACAO
Globalização coloca a criança dentro de
uma universalização. Mesma vestimenta das crianças em todos os países do mundo
-mercado global de produtos para a infância. Mas a difusão da industria
cultural não apenas de produtos, mas em serviços: cursos de ferias, cursos de
inglês,etc.
Principio de individualização- valor e
principio de autonomia. Autonomia é um conceito ambivalente e precisa ser
discutido nas várias dimensões. Uma delas é a idéia de que a criança é tão
competente e capaz que ela pode ter suas próprias regras (isso vem do sentido
etimológico da palavra). Essa idéia de autonomia tem conseqüências na idéia de participação.
Há a idéia de criança global. Difusão
universal de Normatividade inerente ao "melhor interesse da criança".
Norma ocidental moderna da infância. Idéia de que toda a criança tem o direito
de viver em uma família e de freqüentar a escola, e garantir o acesso ao mundo
social pela escola. Globalização tem promovido como nunca no passado, um
aumento das desigualdades sociais nas crianças, que é expressão das
desigualdades sociais no mundo inteiro. Se a situação da infância melhorou
globalmente não significa que todas as crianças tiveram suas condições de vida
melhoradas em todos os países e da mesma maneira. Aumento das desigualdades tem
como conseqüência o desrespeito aos direitos das crianças.
Estamos vivendo em uma sociedade de risco
marcada: pelo desemprego parental, emprego bem escasso, em alguns países da
Europa, como Portugal e Espanha há taxas recordes de desemprego e o eesemprego
parental produz uma serie de conseqüências as crianças e cria riscos múltiplos
a elas; pelos riscos relacionados ao meio ambientes - terremotos, aquecimento,
nunca as crianças tiveram tantas doenças alérgicas; pelos riscos decorrentes
dos acidentes rodoviários e a motorização dos transportes; pelos riscos decorrentes
de guerras e conflitos no mundo.
INDIVIDUALIZACAO
Há a idéia de que a escola deve inserir o
indivíduo na cultura e socializar, escola deve ensinar que a criança deve ser
capaz de fazer avançar e emergir suas competências individuais, ser capaz de
ser competitiva e ambiciosa. Valorização da idéia da performance individual.
Cada homem e cada mulher tem uma missão individual, como se a sociedade fosse uma
associação livre. Por individualismo entendemos desvalorização do coletivo. O ideal neoliberal é de que a
sociedade se auto regula pela concorrência, mas a sociedade não se autoregula,
ela estratifica. Ênfase no privado, fragiliza laços sociais. Neste repertorio
de socialização para o individualismo cabem normas de conduta, princípios de
referência, critérios de performances. Essa idéia de autoregulação e autonomia
cria grandes desigualdades sociais. Pois, a idéia de autonomia só faz sentido
quando conjugada com o principio da solidariedade.
Hoje a imagem da criança é de um ser
humano pleno, hoje a criança é complexa e densa e exprime claramente a
sociedade extraordinariamente complexa. E é essa criança complexa e densa que a
Educação Infantil tem que conjugar. Para isso, as crianças precisam ser
ouvidas.
Uma criança disse: "Os adultos devem ouvir as crianças, porque elas também os
ouvem", Os adultos devem ouvir as crianças porque elas são pessoas e
tem coisas interessantes a dizer. Ouvir as crianças no interior das
instituições é uma condição para garantia dos direitos e uma condição para um
dialogo justo, de partilha o poder, Dialogo entre gerações. Isso exige que
ultrapassemos os mecanismos formais dos adultos, como assembléias, parlamentos.
Precisamos ouvir o que as crianças dizem, como dizem, por suas vozes, gestos,
olhares, silêncios. Expressão corporal das crianças deve ser promovida,
valorizada e interpretada pelos adultos. Precisamos criar formas imaginativas
de escuta das crianças fora dos canais habituais.
A audição da voz é condição da garantia da
proteção às crianças. Proteger vivamente as crianças é ir contra o silêncio,
que é abusivo. Perceber que a
criança é um todo marcada pela vida e seu contexto. Trabalho de escuta,
mas também de reestruturação institucionais. Instituições das crianças precisam
ser vistas como instituições marcadas pelas crianças. Precisamos nos
interrogar: o que a crianças fazem na instituição? O tamanho do mobiliário, as
cores das paredes, as relações humanas, as prioridades, os tempos, as
organizações hierárquicas seriam as mesmas se não tivesse crianças? Como
percebo as vozes das crianças para avaliar as instituições? Como as coisas que
tenho na instituição afetam as crianças? Instituições para crianças precisam
ser pensadas como instituições para crianças e não para adultos.
Criação de um espaço e tempo democrático,
principio de respeito mútuo entre crianças e adultos. Conceito de cidadania
intima, ser cidadão não se esgota na relação com o espaço publico, mas também
se dá no espaço privado . Direitos da cidadania se exprimem nas relações entre crianças
e adultos.
Mudança paradigmática, que não é isenta de
ambigüidade, mas que exige políticas e vontade coletiva, e um grande trabalho
pedagógico.
Educação infantil cresceu a partir de três
perspectivas, que ocorrem anacronicamente, não necessariamente cronológica: 1.
Tradição assistencialista, filantrópica e caritativa: creche, pretensão de
guarda está na gênese de muitas instituições para crianças; 2. Inspiração
desenvolvimentista e escola novistas: jardins da infância; 3. A pretensão
instrucional: a pré-escola (escolarização precoce). Portanto, é um espaço tenso
entre diferentes formas de pensá-la.
A Educação Infantil concebida:
1 Como oficio de criança- necessidade do lúdico,
brincar como ofício do mundo;
2. EI globalizada e o regresso da educação
compensatória. Capitalismo entende educação infantil como mercado, emergência
de empresas que exerce o controle da EI, como apostilas, formações,
dispositivas de avaliação externa, regulação, disputa no mercado de
concorrência que se assumem como mais valias distintivas dentro do mercado educacional;
3. Como cidadã e democrática. Sociedade não pode ser
pensada como mercado, assim como EI. Educação Infantil como defesa dos direitos
da crianças, educar e cuidar em osmose permanente. Educação Infantili
verdadeiramente orientada para a promoção dos direitos.
Educação Infantil tem tensões
permanentes vivida por educadores:
individualização x socialização; autonomia e autoridade; competência e aprendizagem;
Cultura da escola e culturas infanto juvenis; EI como lugar de disciplina e de
liberdade.
Tensões precisam ser vividas, não podem
ser afastadas. Elas colocam dilemas e são as formas como eles serão enfrentados
que vai garantir a educação democrática. E para organizar uma educação
democrática, é preciso: 1.organizar EI como campo de oportunidade: descoberta
cotidiana feita a partir de princípios, privilegia intervenção dos educadores
atentos as crianças e a suas falas, que parte das crianças e de suas práticas
culturais; 2. EI como lugar de encontro de culturas. Lugar em que as culturas
se entrelaçam, crianças devem ser interessadas pelas linguagens dos outros; 3.
EI que é também um mundo social, nunca é demasiadamente tarde para fazer uma
criança feliz. Criança não é apenas entendida e interpretada como ser
aprendente.; 4. Organizar a escola como polis, uma cidade onde tem lugar a
afirmação da identidade social. Educação é afirmação de uma cidadania social,
cognitiva, social.
Conclusões: nessa sociedade complexa, a educação
infantil é chamada para trabalhar com questões complexas. Partir das crianças é um bom caminho, garantir a
resistência reforçando os vínculos. capacidade que as crianças tem de transformar
os objetos, encontrar a novidade naquilo que se repetem continuamente.
Olá! Muito interessante seu blog. Aborda várias questões importantes para a educação infantil
ResponderExcluirSou a Lili, professora de educação infantil em Campinas, SP. Brasil Também registro um pouco do meu cotidiano no blog: -Me ajuda a olhar! - http://meajudaaolhar.wordpress.com
Recentemente, iniciei um apanhado de outros blogs com registros de professores e escolas sobre seu cotidiano. Adicionei também o seu, por ser muito interessante e relevante. Para visitar, clique em
Além dos muros escolares - http://alemdosmurosescolares.wordpress.com
Um abraço
Lili