terça-feira, 27 de agosto de 2013

Espaços da educação Infantil

       Semana passada tive uma conversa com educadores de CEIS e EMEIS na região de São Miguel sobre espaços da educação infantil. Nessa conversa selecionei algumas reflexões que considero importantes de serem compartilhadas quando pensamos em uma pedagogia da infância que considere às crianças. Reflexões que reproduzo aqui para dialogarmos.

- Espaço trata da dimensão física, da organização de mobiliários e materiais que disponibilizamos para as crianças. A maneira como o organizamos revela sempre  a relação pedagógica que estabelecemos com os pequenos. Nas palavras de Ana Lucia Goulart:
“Um espaço e o modo como é organizado resulta sempre das idéias, das opções, dos saberes das pessoas que nele habitam. Portanto, o espaço de um serviço voltado para as crianças traduz a cultura da infância, a imagem das crianças, dos adultos que a organizaram; é uma poderosa mensagem do projeto educativo concebido para aquele grupo de crianças”.

- Já afirmavam os clássicos da pedagogia que a organização do espaço tem influência sobre os usuários determinando em parte o modo como professores e crianças sentem, pensam e se comportam, 
A criação de instituições de educação destinada às crianças pequenas data do final do século XIX e início do século XX e foi influenciada principalmente por esses pensadores clássicos, especialmente aqueles ligados a Escola Nova. Em comum, eles já percebiam o espaço como um elemento central da pedagogia da infância. Destaca-se Freinet, Montessori e Dewey, todos hoje base para a educação na região de Reggio Emilia, na Itália (considerada referência na área da educação infantil) e que precisam ser estudados com mais profundidade nos cursos de formação.

Maria Montessori

 - É preciso que transformemos espaços em ambientes, que é o conjunto do espaço físico e das relações que lá são estabelecidas. O espaço físico precisa se tornar ambiente, isto é, ambientar crianças e adultos. A idéia de que espaço e ambiente são separados só acontece na cabeça dos adultos. Para a criança, o espaço pode ser “o espaço- alegria, o espaço-medo, o espaço-proteção, o espaço-mistério, o espaço-descoberta, enfim, os espaços da liberdade ou da opressão?” (Lima, 1989, p. 30)
     Nesse sentido, quando pensamos em organização de espaço, precisamos nos perguntar: Como nossos espaços tem sido ambientados? Que sensações (físicas, emocionais, sonoras, táteis) provocam em nós e nas crianças? Como se tem constituído as relações ali? Que interações tem sido provocadas pela organização do espaço?

- Para potencializar a expressão infantil deve-se observar como a criança se organiza, o que a favorece em termos de exploração e criação. Muitas vezes o espaço é organizado a partir de pressupostos que o adulto tem, sendo essa uma lógica que nem sempre favorece as crianças. Por isso, torna-se tão importante perceber como as crianças se relacionam com o espaço, quais seus lugares preferidos, o que as atrai ou as repudia, como se expressam oral e corporalmente nos espaços que frequentam.

- O espaço é sempre retrato da relação pedagógica, como bem diz Madalena Freire. O que retrata nosso espaço? O que revela sobre os grupos que convivem ali? É um espaço memória? Aquele  que registra através de sua arrumação e organização o que vai sendo vivido, revelando as descobertas, o crescimento e as dúvidas de crianças e adultos que ali convivem. Ou é o espaço estagnação? Com paredes nuas ou coladas com painéis de EVA - bonita aos olhos de alguns adultos mas que não contam nada sobre quem são os sujeitos que ali estão e que muitas vezes denunciam o estancamento e a diminuição da paixão de viver-conhecer o mundo própria do ser humano, justamente por não revelarem nada das experiências acontecidas ali.



- Temos discutido na área  o quanto as crianças são potentes e criativas., o quanto falam (nem sempre com a boca) e produzem conhecimento sobre o mundo, atribuindo significados as experiências à elas oferecidas. O modo como valorizamos suas produções e a organizamos nas paredes e corredores da escola, mostra para a sociedade que a infância precisa ser valorizada enquanto produtora de cultura. Trata-se de um compromisso social de valorização da infância e as instituições de educação infantil são pólos para isso.


-A valorização das produções das crianças precisa se dar de forma estética, portanto essa produção não ser apresentada de forma descuidada. O blog da professora de uma EMEI na cidade de São Paulo, chamada  Renata Honora, nos mostra como esta valoriza e organiza os trabalhos das crianças e pode ser uma referência para nós. www.fazeresnaescoladeeducacaoinfantil.blogspot.com


-  As marcas singulares das crianças precisam aparecer, elas precisam se perceber como sujeitos singulares que deixam marcas no mundo e que pertencem a ele. Essas marcas não aparecem quando são valorizados trabalhos idênticos, feitos todos da mesma maneira em que não identificamos nenhuma marca pessoal de quem a produziu, como por exemplo, as dobraduras do saci, a florzinha esteriotipada, o desenho pronto do índio,  entre tantos outros modelos que só cabe a criança pintar (muitas vezes da mesma cor que as outras) e que são espalhadas por vários blogs e apostilas.

- O modo como organizamos o espaço provoca interações de diferentes naturezas. Segundo Mara Carvalho e Marta Rubiano, em suas  pesquisas em diferentes instituições de educação infantil, é possível perceber três arranjos espaciais: aberto, fechado e semi aberto. Nos espaços abertos, em geral há um espaço central vazio, porque se acredita que as crianças pequenas precisam de muito espaço sem mobiliários. Nesses espaços, ambas perceberam que as interações entre crianças são raras, e que há a tendência destas em permanecer em volta do adulto, as crianças se espalham pela sala em deslocamentos freqüentes; Nos espaços fechados há a presença de barreiras físicas, como móveis altos e há a tendência da criança de permanecer mais próxima do adulto, evitando áreas em que ele não está (desenvolvimento do apego). Já nos arranjos semi abertos (cantos), o espaço é organizado por zonas circunscritas que proporcionam as crianças uma visão de todo campo de ação. O que se percebe é que nesse tipo de arranjo, as crianças em subgrupos ocupam preferencialmente zonas circunscritas mesmo quando afastadas dos adultos, as crianças se associam mais aos seus colegas e a um grande desenvolvimento do sentimento de competência.



- Essas mesmas autoras apontam que a organização de espaços para crianças pequenas em instituições coletivas precisam considerar algumas funções. São elas:

a) Promover Identidade Pessoal: Ambientes precisam possibilitar que as crianças desenvolvam sua individualidade, permitindo-lhes ter seus próprios objetos, personalizar seu espaço e sempre, que possível participar de decisões sobre o mesmo.

b) Promover o desenvolvimento da competência: Desejo de ser competente é básico no ser humano, nesse sentido, o ambiente deve ser planejado para que as crianças possam desenvolver controle e domínio de seu habitat: fácil acesso aos objetos, sem necessitar de assistência constante. A autonomia é um processo construído e que precisa ser possibilitada às crianças em seu desenvolvimento.

c) Promover oportunidades para crescimento:   Oportunidade para explorar ambientes ricos e variados, Possibilitando o desenvolvimento de:

-Movimentos corporais (andar, correr, subir descer e pular com segurança) . Criança aprende a se mover e a controlar o próprio corpo vivendo experiência que a possibilitem fazê-lo.
- Estimulação dos sentidos: Ter contato com elementos naturais: cheiras, sentir a brisa, as variações do ambiente. Desenvolvimento de atividades em espaços abertos e presença de elementos naturais nos interiores (janelas que permitam a iluminação natural, visão do céu, presença de vasos de plantas).  Variação nas cores, formas, sons, vozes, aromas, toques.

d) Promover sensação de segurança e confiança: Lugar confortável, interessante, desafiador e seguro. Variações dramáticas deixam a criança desorientada. Mas, é importante lembrar que essa sensação não se dá apenas pela dimensão física, mas as relações de acolhimento e generosidade estabelecidas pelos adultos com as crianças são fundamentais.

e) Promover oportunidades para contato social e privacidade: É importante variar  o tamanho da área em um mesmo espaço para oferecer espaços para atividades em pequenos grupos ou de todo o grupo, promovendo diferentes interações. Mas é preciso também organizar espaços privados que  permitam às crianças expressar e explorar sentimentos longe do olhar dos outros, retirar-se momentaneamente do grupo e descansar de novas situações.



Quando falamos de espaço e ambiente são muitas as questões a serem consideradas. Temos a tendência de torná-los auto-evidentes, como se não fossem permitidas mudanças  porque foram assim desde que o conhecemos. Isso não é verdade! O espaço nas instituições de educação infantil são organizados por sujeitos e podem ser sempre reorganizados por eles.

Nesse sentido fica a última pergunta para refletirmos: Como estão nossos espaços??? Em que medida se aproximam ou se afastam da pedagogia que acreditamos e que considera de fato às crianças como foco do processo educativo? 

Grande abraço!





Algumas referencias bilbiográficas sobre o tema para aprofundamento:

AMBROGI, Ingrid H. Reflexões sobre os usos do espaço como garantia para a criação de meninos e meninas pequena. Pro posições; Campinas. Vol 2., n. 22 (65), 2011.
lARAÚJO, J. M.; ARAÚJO, A. F. Maria Montessori: infância, educação e paz. In: FORMOSINHO, J. O.; KISHIMOTO, T. M.; PINAZZA, M. Pedagogia(s) da infância: dialogando com o passado construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007.
lCARVALHO, M. I.; RUBIANO, M. R. B. Organização do espaço em instituições pré-escolares. In: OLIVEIRA, Z. M. R. (Org.). Educação Infantil: muitos olhares. São Paulo: Cortez, 1994.
lELIAS, M. DEL. C.; SANCHES, E. C. Freinet e a pedagogia – uma velha ideia muito atual. In: FORMOSINHO, J. O.; KISHIMOTO, T. M.; PINAZZA, M. Pedagogia(s) da infância: dialogando com o passado construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007. p. 145-170.
lFORMOSINHO, J. O.; KISHIMOTO, T. M.; PINAZZA, M. Pedagogia(s) da infância: dialogando com o passado construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007.
lHORN, Maria da Graça. Cores, Sons, Aromas e Sabores: A Organização do Espaçona Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed,1998


Documentos oficiais que tratam do tema e que são fundamentais para serem lidos:





5 comentários:

  1. Olá Janaina, Muito bom ser lembrada em sua reflexão sobre espaço na educação infantil.
    Estou na EMEI Jean Piaget...quando puder faça uma visita para conhecer nossos espaços.bjo Renata

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  2. Gostei muito das suas colocações a respeito do espaço e principalmente lembrar que os espaços na educação infantil devem refletir sim as suas vivências, sendo de suma importancia a exposição das atividades das crianças pois assim elas se sentem parte desse processo. Parabéns!!

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  3. Gostei muito das suas colocações a respeito do espaço e principalmente lembrar que os espaços na educação infantil devem refletir sim as suas vivências, sendo de suma importancia a exposição das atividades das crianças pois assim elas se sentem parte desse processo. Parabéns!!

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  4. Seu blog é muito bom. Gosto do seu texto e suas experiências. Muito obrigada!
    Também temos um blog de Educação Infantil, o www.tempodecreche.com.br , seja bem vinda!
    Abraços!

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  5. Bom dia! Gostei muito, estes espaços falam da vivencia das crianças e mostra todas as experiência cias que as crianças desenvolvem

    como protagonista. O incrível e que posso olhar estas belezuras e reinventar. Obrigada.

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