Olá a todos,
Disponibilizo hoje o
terceiro texto escrito por André Carrieri sobre Documentação Pedagógica.
Aproveito também para
compartilhar o vídeo: "Como fazer registros pedagógicos em foto e vídeo", produzido pela Nova Escola, que contém entrevistas e dicas de André Carrieri, André Spinola e Bruno Mazzoco sobre a
melhor maneira de registrar situações de sala para aprimorar nossa prática .
A câmera é um brinquedo
O filósofo tcheco,
naturalizado brasileiro, Vilém Flusser dizia que "a fotografia nunca vai ser uma profissão, porque a máquina é um
brinquedo". O que queria dizer é que, diferentemente de outros
instrumentos que o homem manipula no seu trabalho árduo, cotidiano, a câmera
permite a experimentação, o jogo, a arte, e que o resultado depende de quem a
utiliza.
A primeira associação
que me vem à cabeça é que existe uma ligação forte entre fotografar e brincar.
Essa ideia fica clara quando realizamos um passeio fotográfico pelo espaço
urbano da cidade. Existem condições que nos levam a uma outra dimensão: um
grupo de pessoas, fora do estado funcional na cidade, do tempo cronológico,
coletando imagens fotografáveis. A concentração e o movimento corporal dessa
experiência é suficiente para não querer parar de fotografar. Já vi acontecer
com grupos em cidades como São Paulo, Salvador, Jundiaí, São Carlos. E agora,
Belo Horizonte.
Na nossa saída pela
cidade em busca de experiências fotográficas o professor não trabalha com a
câmera, mas brinca com ela. Como um jogo de xadrez, o professor/fotógrafo
procura um lance novo, uma imagem nova, a fim de realizar uma possibilidade
oculta no jogo de fotografar. E essa pessoa que manipula a câmera "não é um trabalhador, mas jogador: não
um homo faber, mas homo ludens", diz Flusser. A câmera funciona
efetivamente em função da intenção lúdica do fotógrafo.
A afirmação "a máquina é um brinquedo" nos
possibilita estabelecer ainda outras associações livres. Primeiro, que este
aparelho está acessível a todos que querem "brincar" e que não
necessariamente precisamos esperar por uma excelência profissional para sermos
fotógrafos. Vincular o ato de fotografar ao ato de brincar legitima qualquer
pessoa, fotógrafa ou não, a se arriscar mais. Segundo, que fotografar é como um
jogo. O ato fotográfico é um jogo. Por isso, talvez, sentimos que nesse estado
tão concentrado fotografamos com o corpo todo, usamos todas as nossas
referências culturais, nos movemos rapidamente e, naquele exato instante,
apertamos o botão da câmera, para conseguirmos uma "boa jogada".
Flusser fala que "fotógrafos não trabalham, agem. [...]
o fotógrafo produz símbolos, manipula-os e os armazena. Escritores, pintores,
sempre fizeram o mesmo. O resultado deste tipo de atividade são mensagens:
livros, quadros, projetos. Não servem para serem consumidos, mas para
informarem, serem lidos, contemplados, analisados e levados em conta nas
decisões futuras". Parece que ele está querendo sintetizar a
documentação pedagógica: conteudos lúdicos para serem lidos, contemplados,
analisados e levados em conta nas decisões futuras.
No livro Filosofia da caixa preta (São Paulo: Hucitec, 1985), o filósofo termina
o capítulo com um parágrafo sobre a câmera fotográfica que invoca a nossa
participação para o jogo: "a câmera
fotográfica é um objeto tecnológico, feito de plástico ou metal. Mas não é isso
que a torna um brinquedo. Não é a madeira do tabuleiro e das pedras que torna o
xadrez, jogo. São as virtudes, os caminhos possíveis contidos nas regras: o
software". O software é a
nossa maneira individual e intransferível de olhar e ler este universo feito de
luz e sombra.
André
Carrieri
29 de julho de 2014
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